terça-feira, agosto 31, 2004

"Se procurar bem, você acaba encontrando
não a explicação (duvidosa) da vida,
mas a poesia (inexplicável) da vida."

Carlos Drummond de Andrade
Indiferença (ou O orgulho de ser um estudante “asséptico”)

Não superestimo o ambiente à minha volta, como tantos outros o fazem. Sei dos meus privilégios, conheço minha história, moldo meu mundo. Reconheço minhas possibilidades, e estas são muitas. É, perspectiva vem de berço, talvez, e as minhas são várias... Tenho um nome, uma casa, uma casca – e esta sempre está muito limpa. Ajudo aos outros, mais por caridade que por outra coisa, mas não os reconheço: os “outros” não são meus semelhantes – estes, pois, reconheço de longe, estão ligados a mim pelo umbigo.
Observo muitos mundos de janelas: a do meu carro, a do meu apartamento, a da minha faculdade... Em frente a mim há sempre uma janela a dividir, em duas partes, o ar que nos envolve: do lado de cá, uma atmosfera resfriada de ar-condicionado, criando um tom de Suíça, aquela que não conheço ainda mas me falaram que é exemplo - de cidadania, de riqueza, de sucesso, de povo, de país. Lá fora, o suor goteja fartamente das frontes atordoadas pelo barulho, as roupas grudam na pele úmida, o hálito é quente de calor e cansaço, pessoas vão e vêm num desatino – não tenho pressa.
Minha vida é asséptica e doce. Rio, falo alto, gracejo, num descompromisso cego. Nasci alienado e cresço para alienar. Sempre faço o que é certo. E é hora de girar, mais uma vez, a roda do mundo...

sexta-feira, agosto 27, 2004

Post anterior: texto escrito no ano passado, acho, e uma pequena tentativa de falar a respeito de uma questão muito conhecida de todos... Dor física, enfermidades, cor, dimensões, aparência e estética, deficiências - corpo. Carne.
Adoraria lembrar, mas não me recordo mais, de uma interessantíssima fala do personagem do ator Betito Tavares na peça Karma... Só lembro que ele começa a descrever o ser humano, “dois olhos, um nariz, uma boca, dois ouvidos, um tronco que sustenta membros, cada membro superior com duas mãos, cada mão com cinco dedos, totalizando dez dedos...” e por aí vai... Isso para dizer, pelo que entendi, que os homens eram seres semelhantes, irmãos. Então, se bem me recordo, outro personagem aponta para alguém na platéia e pergunta algo do tipo: “Porque, então, ele é tão diferente de mim?” ao que o personagem de Betito responde: “É karma!”
Bom, com todo meu ceticismo, seria brincadeira dizer que vejo as coisas dessa forma. Mas, à parte qualquer tentativa de explicação mística ou existencial, a verdade é que tal descrição serve para a grande maioria da humanidade, e no entanto diz muito pouco. Além disso, uma grande verdade é também que não se pode negar o quanto as simples peculiaridades físicas, genéticas, raciais, já influenciaram a história da humanidade e influenciam, ainda hoje, cada ser humano, em particular. A discriminação racial; as limitações das pessoas que têm algum tipo de deficiência física; as vidas que de repente são viradas de cabeça para baixo pelo diagnóstico de uma enfermidade, mudando tantos planos; a aparência física e a beleza como fatores determinantes dos próprios relacionamentos, das formas de convívio social...
Trata-se de um assunto difícil: muitos consideram mediocridade admitir que a beleza, por exemplo, influencia o próprio nível de tolerância às pessoas e aproximação entre as mesmas, na sociedade, na vivência coletiva diária, na vida profissional, ou também e, principalmente, na vida amorosa. Estes criam frases bonitas, dizem que “o que importa é a alma”, ou algo do tipo... Mas, ora, não se trata de assumir como naturais valores imbecilizantes ou mercadológicos de sociedade, mas de reconhecer determinados fatores que subjetivamente motivam ou dificultam a aproximação, o aceitamento e o entendimento entre as pessoas.
Não quero com isso, portanto, defender valores fúteis, nem assumir uma postura fatalista, afinal, as pessoas superam deficiências, enfermidades, preconceitos, e são notórios os casos daqueles que superam tais “limitações” ou adversidades, tornando-se muito mais fortes, humanos e - o mais importante de tudo – felizes. Muito pelo contrário, é justamente o reconhecimento dessas diferenças, a solidão com que temos que lidar com essa condição de cada um, individualmente, e, enfim, a possibilidade de admitir a existência de tais diferenças que nos torna, acredito, mais humanos, mais tolerantes, mais solidários.
Enfim... Em plena época de intolerância racial, discriminação, segregação social, culto à forma física em detrimento da consciência humana (não me sinto à vontade pra falar na existência de uma suposta “alma”, no sentido religioso do termo), não é de endoidar qualquer um pensar que algo tão independente de nossas escolhas, como o é esse nosso “ser físico”, acaba determinando tantos aspectos da nossa vida? E da mesma forma, não é igualmente impressionante que seja por meio desse mesmo “ser físico” que vivenciamos tantos prazeres como, por exemplo, sentir a indescritível sensação de dar um longo mergulho no mar, ou demonstramos nosso afeto, ou criamos nossa própria linguagem, seja ela escrita, falada, ou apenas demonstrada pelo olhar...
Pode ser um tema difícil, mas é um bom desafio para os religiosos e uma motivação e tanto para quem não perde a oportunidade de pensar na morte da bezerra... :P

Para ouvir: Alpha Petulay
...dos Diálogos...

Havia uma barreira intransponível... Algo que o separaria de todos ao seu redor, que o impediria de atingir um momento de verdadeira proximidade com aqueles que o cercavam. Os limites físicos de sua consciência, seu intelecto, sua razão, seus sentimentos, isolavam sua verdadeira identidade em um interior que não o comportava. E ficou perplexo ao constatar que aquela limitação absurda era imposta a todos os outros, talvez... Mas por que de modos tão diferentes? O que levava cada ser humano a trazer consigo, estigmatizados, os sinais de sua vulnerabilidade? Entendia que havia recebido algo especial, que o diferenciava de qualquer outro e o tornava único. Mas por que tantos estigmas, por que deixar expostos tantos pontos fracos, e permitir a todos a facilidade do estranhamento, do desajuste, da reclusão?
Cada qual com suas feridas e suas dores. A carne como uma representação frágil da sua individualidade... Todas as armas foram dadas, ao homem para acusar, recriminar, e ao mundo para ferir. O tempo a ferir, o espaço a ferir e o progresso a ferir, com seu asfalto, sua poluição, seu concreto: a mais primitiva recordação da face animalesca do homem. A face real, visível.
A cor, as dimensões, as limitações... A vontade de pular, a impossibilidade de andar. A mudança total das possibilidades humanas, delineadas pelo acaso e delineando o futuro. E a história de cada ser humano se constrói, inexplicável...

segunda-feira, agosto 23, 2004




Dia desses assisti novamente ao filme Persona, de Ingmar Bergman. É incrível como a cada vez que o vejo percebo novos detalhes, novas possibilidades de interpretação, e aos poucos vão ficando mais claras na minha mente as influências das suas imagens na minha forma de ver o cinema e até mesmo a própria realidade (afinal, acho que é nisso que a arte consiste, essencialmente – uma forma peculiar de perceber a realidade e traduzi-la em uma linguagem estética).
Persona não é entretenimento... É um filme difícil, por vezes cansativo, e com um enredo mínimo, e por isso mesmo ele é tão importante, pois explora a linguagem do cinema em sua plenitude, utilizando não apenas seus diálogos, mas principalmente suas imagens, sons, fotografia e edição para analisar o processo de construção, desconstrução, troca e fusão de personalidades, bem como o uso de máscaras sociais, o cinema e o teatro como representação da realidade e a relação de “vampirismo” estabelecida por essas formas de arte, na medida em que os atores buscam na realidade e nas outras pessoas elementos para construírem suas personagens... Daí a referência à persona, que tanto pode ser a máscara utilizada no teatro grego, como a própria máscara social que as pessoas criam para si.
Pelo fato de utilizar esta linguagem predominantemente visual, esta obra desmistifica a necessidade de uma explicação racional e contextualizada de cada imagem em um filme. Utilizando a estética para comunicar emoção, percepções subjetivas ou as próprias idéias e questionamentos que o motivaram, Bergman suplanta a necessidade de uma história coesa, de um enredo em sua concepção tradicional. O resultado é uma experiência quase onírica, em que a idéia de sonho é sempre quebrada, no entanto, pela noção de que estamos assistindo a um filme, a uma representação. E é, na verdade, justamente essa persistência do diretor em tornar evidente que aquilo a que estamos vendo trata-se apenas de um filme que torna esta obra tão peculiar e que gerou em mim tanto entusiasmo.
Explica-se: um ou dois meses depois de ver Persona pela primeira vez (e ainda com o filme na cabeça, perplexo), comecei coincidentemente a ler Argumentação contra a morte da arte, de Ferreira Gullar, livro indicado por uma amiga e que defendia a idéia de que a sucessão de vanguardas e a necessidade por inovações artísticas levaram à destruição da linguagem estética. Pois bem, tal livro despertou-me bastante entusiasmo e um dia, especificamente, li sobre o momento da história da arte em que os artistas sentiram necessidade de acabar com a reprodução perfeita da realidade e evidenciar a forma de representação, seja de modo sutil, utilizando novos materiais, deixando visível uma pincelada ou partes do quadro incompleto, ou até mesmo expondo telas em branco, rasgadas, perfuradas, para evidencia-las como instrumento da representação buscada pelo artista. Em todos os casos, o foco do livro na discussão a respeito desse momento da arte estava voltado às artes plásticas, mas foi a partir daí, no entanto, que percebi que era exatamente isso, também, que Bergman havia buscado em Persona: criar um filme metalingüístico, não no sentido de abordar o cinema e a produção de filmes em seu enredo, mas sim de gerar a reflexão a respeito dessa forma de arte por meio da própria construção do filme e de suas imagens, quebrando a ilusão, o “mundo fantástico da sétima arte”, para mostrar que o cinema consiste, acima de tudo, em uma representação, uma forma de linguagem, de exposição de idéias e de acepção da realidade. Assim como os pintores que pretenderam questionar a função de seus quadros rasgando suas telas e transformando-as na própria obra, ao invés da utilização da habitual representação pictórica, Bergman também utiliza-se de um efeito visual para literalmente rasgar a película do filme em um dos momentos-chave de sua obra (criando uma das cenas mais impressionantes já vistas no cinema). Somam-se a esse artifício a seqüência inicial que mostra diversas cenas de diferentes linguagens cinematográficas (cinema mudo e desenho animado, por exemplo), ou a própria cena que antecede essa seqüência e abre o filme, mostrando um projetor e a película que começa a ser projetada, assim como a cena próxima ao final em que é mostrado o cineasta com sua câmera. Em todos esses momentos, Bergman estimula a reflexão sobre o cinema, o teatro, a expressão artística, sua impotência diante das atrocidades humanas e o seu papel como instrumento para a compreensão do ser humano, da realidade.
O filme, claro, permite inúmeras interpretações. Ele pode ser visto também, por exemplo, pela vertente religiosa, abordando a questão do pecado e do sacrifício humano, ou como uma reflexão sobre os problemas da maternidade, ou ainda como uma análise das relações sociais, da inveja, do ressentimento... O melhor, no entanto, é deixar-se envolver pelo clima onírico da história, por suas imagens hipnóticas (algumas extremamente sombrias) e desfrutar de uma ousada experiência da sétima arte.

...

P.S. Bom, não quero parecer um intelectualóide, daqueles que acham que uma obra precisa ser complicada ou até mesmo ininteligível para que reflita a capacidade do seu autor ou a sua importância artística. E não quero com isso parecer inteligente também, muito pelo contrário: não dá para contar aqui mas garanto que é cômica a história da primeira vez em que vi esse filme. Adoraria ser outra pessoa, naquele momento, só para ver minha cara de perplexidade, em frente à tela... :P De qualquer forma, é muito bom (embora seja também, infelizmente, muito raro) encontrar um filme que nos desafie tanto, intelectual e emocionalmente, mesmo que à custa de um pequeno golpe em nossa auto-estima.

domingo, agosto 22, 2004

Um ótimo desfecho para um cd que é danado de bonito... Ouço sempre, agora, e cada vez mais, Badly Drawn Boy. Gosto do fato de que suas músicas sempre parecem beirar a pieguice, o óbvio pop, mas sempre surpreendendo e, acima de tudo, mantendo a simplicidade... Um bom exemplo é “Cause a rockslide”, que começa com uma melodiazinha meio ridícula e uma vozinha meio Bee Gees, para no meio mudar totalmente, com sons esquisitos de arrepiar a espinha (eu tenho problemas com sons desse tipo desde a infância :P), e depois mudar novamente, terminando com versos bonitos, cantados de forma simples e contagiante... Outras, como “Once around the block”, são um bom exemplo da típica música que ainda vai embalar muitos momentos com a sua leveza...
Enfim... a última de dezoito músicas cativantes:

Epitaph

Please don't leave me wanting more
I hope you never die
There's no need to say why
Just promise that you'll try
To give me all you can
I'll never ask for more
There's new life through the door
A cradle rocks and falls
As new fruit fills the tree
Cements the melody
To signify we're free
Our troubles passing

Through decaying, simple times
I'll tread your trail with pride
C'est maintenant decide
I've nothing better

Please don't leave me wanting more
I hope you never die
There's no need to say why
Just promise that you'll try

sexta-feira, agosto 20, 2004

Já que falei sobre o Vestibular, espero ter oportunidade, depois, de dizer aos que têm me cobrado empenho e me advertido com relação à minha injustificável apatia:
Eu sei que é preciso estudar, preocupar-se, pois a situação não está para brincadeira. Mas a verdade é que tenho estado imerso em um amontoado de conjecturas; tomado por um descontentamento referente a situações de natureza puramente subjetiva e por uma espécie de indignação com meus pensamentos involuntários e posturas demasiadamente espontâneas.
Falando simplificadamente: estou arretado comigo mesmo mas, como ainda assim preciso continuar estando comigo o dia todo, compartilhando cada pensamento e presenciando todas as minhas ações, enfim, já que o divórcio de mim mesmo não é possível, vou ter que arrumar um jeito de fazer as pazes. Em breve espero estar com disposição para o estudo e ter clareza com relação ao que farei com minhas 24 horas diárias. :P
É quase sem querer que percebemos, às vezes, o momento em que os planos que no início eram orientados pelos familiares e que depois haviam passado a ser feitos conjuntamente com eles começam, de repente, a ser apenas comunicados aos mesmos.
Não foi sem espanto que minha mãe, por exemplo, descobriu que terá novamente um filho vestibulando, que eu já estava inscrito e tudo mais. “Você e sua irmã agora estão assim, fazendo tudo primeiro pra falar depois...” Só então me dei conta do que tinha feito e reagi com estranheza, inclusive, ao fato de que tomei tal decisão, enfrentei todo tipo de dúvida e reflexões sem compartilha-las com aqueles aos quais mais atribuo confiança e consideração. E se eu fico ainda tão perplexo com certas idéias que passam pela minha cabeça, imagina aqueles que vêem todas as perspectivas serem subvertidas, refeitas de uma hora para outra?
Realmente não deve ser fácil entender uma mente sempre tão volúvel, e mais difícil ainda é ver uma pessoa pela qual torcemos tanto, nos dedicamos e sacrificamos, à custa de tantas privações, do esforço excessivo, do desgaste, da preocupação, etc, simplesmente nos deixando tontos a cada dia com suas inconstâncias, revelando aos poucos que tudo que foi construído repousa sobre uma superfície tão tênue que não se sustenta, sem desmoronar...
A verdade é que tal decisão só causa espanto porque tudo, até hoje, foi remoído por mim em silêncio, aos poucos se solidificando a certeza da inadequação e o descontentamento com um curso, uma possível carreira e um modo de vida impraticáveis, incompatíveis com uma personalidade ainda em (des)construção.
O fato é que há decisões que cabem unicamente a nós mesmos. Para resolver o que faremos, o quanto estamos dispostos a arriscar e o que priorizamos, não há possibilidade de ajuda e muitas vezes não há muitos que nos dêem conforto...

Lembrei, no entanto, nem sei porquê, de uma história, que pouco tem a ver com esse assunto mas que serve de contraponto a esta solidão que sentimos, às vezes, quando o “destino gira em nossos dedos”. Uma vez estava no ônibus, viajando para Juazeiro, era uma época em que estavam ocorrendo muitos assaltos na estrada e o último realizado a um ônibus daquela empresa tinha, inclusive, deixado como vítima um motorista – faleceu com um tiro na cabeça. Com isso, aqueles que enfrentavam a estrada diariamente estavam tensos, tendo que trabalhar tomados pela preocupação de que fato semelhante voltasse a ocorrer. O rapaz que ia ao meu lado conhecia boa parte dos motoristas da empresa, eram amigos do seu pai, e a certa hora, quando um deles foi deitar-se para descansar e dar lugar ao outro, dirigiu-se ao rapaz e falou: “depois vá lá na frente conversar um pouco conosco... Ultimamente estamos viajando muito tensos, e é sempre bom ter alguém ao lado... Não nos deixa mais protegidos, mas é bom para dividir o peso, às vezes... Juntos, o peso fica um pouco menor”.

Apesar da inconstância, do silêncio, da estranheza, fui mais uma vez apoiado, incentivado, minha família renovando em mim, com palavras, a certeza da sua confiança e a sua crença no meu sucesso... Crença que nem eu mesmo posso ter muito, haja vista que conheço meus pensamentos... De minha parte, sei que não acabou ainda; a cada dia, situações vão tornando-se mais claras, tudo que não foi dito se evidenciando e ganhando aspecto de acontecimento súbito. E serão eles os que ficarão ao lado, dividirão o peso, mal disfarçando a reprovação e a preocupação, talvez, mas se for o caso, dando um sorriso comovido e ajudando a manter a tênue estrutura que não está bem certo se desaba ou não...

terça-feira, agosto 17, 2004

O Casa Amarela (Nova Torre) quando passa (se é que passa, sempre) naquele seu peculiar horário entre as 13h20 e as 14h, causa comoção pública. Esteja você sentado - ou não - comodamente, ou melhor, resignadamente, naqueles assentos meio enferrujados, isolados nos lados e atrás por propaganda de produto de cabelo, não se preocupe: nem precisa observar quando ele está vindo. Isso porque, apontou um ônibus amarelo, azul e branco no alto da ponte, já começa o alarido... Senhoras suspendendo as sacolas do carrefour tristemente depositadas na calçada para dar descanso aos braços cansados de esperar, outras pessoas mal disfarçando sua ânsia, a ponto de ir para o meio da rua e pular em frente à condução, dizendo “pare, pelamordedeus!”, aqueles outros tentando adivinhar o local exato onde o veículo irá parar para serem os primeiros da imensa fila... Depois, o que vem é ainda mais típico: um ou outro furando fila, os mais apressados empurrando, os últimos tendo que praticamente compactar-se, sendo cuspidos para dentro (ou para fora) pelas portas que se fecham sem ao menos esperar os retardatários chegarem ao segundo – e mais seguro – degrau...
Nesses tempos de chuva, somam-se a essa bagunça outros elementos: todo mundo se espremendo embaixo do pequeno abrigo, se esquivando das goteiras existentes no mesmo ou perigando furar os olhos alheios com guarda-chuvas inquietos, sem que se possa esquecer também, claro, do constante perigo proporcionado pelo enorme buraco no asfalto, acumulando lama que se espatifa pra todo lado, tão logo um carro sem modos passa suas rodas, com pressa, pelo trecho da rua tantas vezes remendado.
Há ainda outros acontecimentos bastante usuais: cartões passe-fácil que nunca funcionam apropriadamente; maquineta para a leitura dos cartões que pede para você retira-lo, quando você sabe que precisa deixa-lo mais um pouquinho para que acenda a luz verde; aquele papelotezinho onde o cobrador cola os vale-transportes que recebe aos montes...
Tudo isto, somado aos eventuais pregadores religiosos, cantadores, pedintes, esnobes, estudantes, etc, forma um quadro dos mais típicos. Estamos em uma metrópole, afinal, e o silêncio é privilégio de poucos.
Estou com uma necessidade premente: viver coisas novas.
Conhecer pessoas novas, lugares novos, novos aprendizados...
Frequentar uma nova faculdade também seria bom, estudar outras áreas de conhecimento. Ouvir uma nova banda que se tornasse minha favorita, ver um filme que traria um novo universo a povoar minha mente nas caminhadas pelo centro da cidade e encontrar um novo livro para servir de Bíblia, já que, pelo menos por enquanto, só há Marciano mesmo a ser seguido...
Decobrir um novo cacoete, um sentimento inusitado, uma reação inédita a um fato igualmente imprevisto, uma palavra nova, uma idéia que nunca tive, uma sensação irrefreável de destruir o que já era certo e reinventar prioridades.
Uma guinada à esquerda (sempre à esquerda, espero, porque tem coisas que não precisam mudar...), um novo olhar crítico, um novo resultado para a autocrítica sempre previsível... Aliás... Não fazer autocrítica, e acreditar que durante algum tempo pode-se apenas agir, errando à vontade.
Não reconhecer-se, até, ou melhor que isso: ser totalmente diferente e ainda assim, achar-se perfeitamente coerente, percebendo com prazer a complexidade humana e utilizando-a para o proveito de sua liberdade.
Para tanto, basta a hora seguinte, o dia seguinte, afinal... Deixar tudo para trás, sem reciclagens, sem lamento. Acordar-se, de manhã, incontestavelmente novo, sem passado... Mandar tudo mais à merda.
Assim, haverá um dia em que serei tão irreconhecível que, para o bem do entendimento, deverei ser apresentado a mim mesmo.

sábado, agosto 14, 2004

Sarau.
Um certo constrangimento, logo de início.
Carreteiro.
Muita música e pouca (apenas uma) poesia.

Eu posso nunca realmente chegar a estudar lá, mesmo, mas, só por despeito, já batizei com minha urina os muros da Casa de Tobias.


"Minha terra é a terra que é minha
E sempre será
Minha terra
Tem a lua, tem estrelas
E sempre terá.
...

E nossa história
Não estará
Pelo avesso assim
Sem final feliz.
Teremos coisas bonitas pra contar
E até lá
Vamos viver
Temos muito ainda por fazer
Não olhe pra trás
Apenas começamos
O mundo começa agora, ahh!
Apenas começamos."

sexta-feira, agosto 13, 2004

A julgar pelas últimas palavras, escritas anteriormente, o nível de humor aqui está caindo vertiginosamente, de novo. Não escrevo mais quando estiver com sono, de madrugada... Dá nisso. :P

...

E só agora vi que hoje é sexta-feira 13, e graças a Deus tem cada vez menos gente falando besteiras supersticiosas por aí. Ou será que é porque nunca mais assisti à televisão? Lá, eles sempre têm matérias-lixo recicladas, falando de gatos pretos, escadas e bobagens estadunidenses, como bruxas, halloween...
Aliás, acho que só quem gosta dessas coisas mesmo é a televisão. E os cursos de inglês, claro!

Não sei pros outros, mas pra mim o dia começou ótimo, ouvindo música muito boa no rádio, por acaso.
E pra espantar qualquer mau-humor, pessimismo, ou a azucrinação da mídia (que pode ser o verdadeiro terror não só desta, mas de todas as sextas-feiras do ano), vai um trecho de outra música da mesma procedência da que ouvi hoje cedo, ao acordar:

"Não fale mais em desgraça,
falar em zica só atrasa".

Para ouvir (não sei se no rádio, mas em algum lugar): Por que - Otto

quinta-feira, agosto 12, 2004

... O único momento em que a literatura tem final feliz é nos livros de auto-ajuda...

Pois é, humanos! Acontece às vezes, na vida real, o que se lê em livros. E o mais angustiante é que já se sabe o final, e este não é o que se sonha, mas o que se evita a todo custo, quase sempre.

Para viver na coletividade, há que buscar a paciência, a resignação, uma anestesia... Tentamos mudar, e nos tornam, os outros, imutáveis... Queremos calar, mas sempre falamos. Tentativa esquizofrênica de querer, de velar uma vontade de fuga em mutismo defensivo...

Hoje é o dia em que eu deveria fazer planos. Ou pelo menos reconhecer a petulância de considerá-los realizáveis.
Mas prefiro mandar todo mundo ir se catar.

Obs.1 Xingamento esquisito, não sei direito o que signiffica, agora reconheço.
Obs.2 Antes estivesse bêbado, pois seria uma boa justificativa para explicar por que não entendo porra nenhuma desse troço aqui.... Mas estou é cansado, de tudo...
Tá certo, tá certo... Passei dos limites no último post. Acontece que simplesmente não consigo escrever pouco, é uma espécie de compulsão, necessidade de extrair o máximo de cada pensamento.
No fim, isso aqui parece mais um antiblog, uma contra-reforma internética, banindo tudo que é prático, acessível, interessante, pra cair no marasmo do que é inconclusivo e inconvenientemente extenso.
Se não me conhecesse, diria que há uma certa propensão megalomaníaca... Mas é só falta de jeito, mesmo...

quarta-feira, agosto 11, 2004

Eu já tinha escrito algo para postar hoje, mas alguns pensamentos e preocupações me levaram a colocar aqui um texto que fiz há um tempo atrás, em um momento em que reflexões semelhantes às de hoje me motivaram a questionar determinados comportamentos.
Não por acaso, talvez, tenha visto o poema de uma amiga hoje falando do poder, da disputa pela obtenção desse poder e da perplexidade dos homens diante da situação de permanente disputa e agressão que eles mesmos criam.
Enfim, espero que entendam minha intenção ao escrever isto.



Os transgressores*

Como indivíduos socialmente atuantes, empenhados em questionar, inverter e transformar, uniram-se em torno de seus objetivos e fundaram seus grupos. Encontravam-se, discutiam, formulavam... Juntos, em longos encontros, certos de sua lucidez, decidiam conflitos humanos, reprovavam posicionamentos e destituíam poderes. Detentores de uma nova verdade, lutavam para desconstruir pensamentos burgueses e mesquinhos de individualismo. Eram tão melhores, suas propostas...
Estavam cheios da revolta, da urgência e da necessidade de agir, impulsionados pelo súbito senso de responsabilidade e embriagados pela beleza de mudar o mundo. Assim, decidiram que seriam os lúcidos entre todos os outros e tomaram para si o privilégio de personificar a imagem de uma minoria salvadora. Detinham o conhecimento, os meios e o esclarecimento para tal; cabia-lhes trazer a luz. Eram os iluminados.
Em segredo, tramaram seus encontros, em que destrinchariam táticas, teorias e ideologias incertas, concedendo e conciliando, porque a revolução também tinha dessas coisas! Deveriam estar reunidos e juntos sentiam o dever de desmascarar uma elite apodrecida, ainda mais apodrecida em contraste com a massa de alienados, massa tão sofridamente alheia que seu gemido era quase um rangido de máquina, de tão instintivo e mecânico. Cabia-lhes expor toda a mediocridade dos pragmáticos, cuspir em seus valores e debochar de suas patéticas atitudes burguesas.
Eles não! Não eram eles, os burgueses. Eram apenas espertos. Sabiam que na vida tudo se levava no jeito, e o equilíbrio e a parcimônia eram uma virtude. Eram revolucionários, ora, não eram bárbaros! Qual o problema em tomar seu cappucino e comer suas torradinhas com patê confortavelmente acomodados em sua poltrona de couro e em frente à sua TV a cabo de 140 canais? Não eram rebeldes sem-causa, afinal, e o que importava eram as idéias!
De todo modo, isto era em casa, onde muito pouco adiantava o romantismo de fingirem-se oprimidos e marginalizados. Não rua, não havia espaço para moderação e tolerância com os confortos. Lá eram cavaleiros do apocalipse, armados com muita ousadia, munidos com palavras duras e dispostos a qualquer agressão não-física, que não lhes ameaçasse a boca tão cheia de dentes.
Eram, nestes momentos, os transgressores, os que iriam mudar o mundo. Afirmar-se-ia, no entanto, e com certa razão, que estavam logo ao lado dos piedosos e sua distribuição de migalhas, tendo como elemento de identificação entre ambos a prepotência de serem salvadores.
Enquanto isso, poder-se-ia encontrar ainda, bem ali, ao lado, despretensiosos e leves, os que na espontânea forma de encontrar o próximo, de reconhecê-lo e amá-lo, não haveriam de mudar, ainda, o mundo, mas aprenderiam a viver nele, e nele construiriam um resquício de fraternidade. Certeza, não tinham; respostas, muito poucas; apenas uma inquietação, uma curiosidade que lhes atiçava as idéias e desordenava as prioridades de suas vidas. E era assim, fiéis a essas prioridades e misturados aos demais, que estes últimos arriscariam muito, desprovidos de compromisso com rótulos e certos de sua fragilidade, mas com uma grande propensão ao aprendizado e à vivência que constrói e muda, solidamente, posturas seriamente refletidas e longamente gestadas.

*Feito ao longo de um dia de poucas utopias e ânsia pela vivência, lembrando e unindo retalhos de Milan Kundera, André Techine, Fernando Sabino e Fred Zeroquatro. Muito pouco aí é meu, talvez apenas a forma mal-acabada que dei a tantas boas idéias, de tanta gente. De qualquer forma, é um gemido legítimo, não-mecânico.


...


Em nome de objetivos diversos, manipula-se, intriga-se, destrói-se, enfim... E é no mínimo lamentável que a semente de tudo isto, de tanta desavença, seja plantada bem cedo, às vezes ainda na juventude. Na política, mesmo, vê-se de tudo: há desde os que criam para si uma persona de oprimido só para legitimarem suas ações, agirem em nome do povo, usarem o respaldo da coletividade em nome de interesses próprios e criarem uma imagem de "revolucionários", até os que acreditam no capitalismo humanizado, na responsabildiade social das empresas como forma de diminuição das desigualdades e no assistencialismo como modo de distribuição de renda.
Pode, no entanto, parecer romantismo, falso altruísmo ou pura pretensão , mas acredito sim na ação política movida pela simples vontade de atuar coletivamente, pela busca da fraternidade, do engrandecimento humano, do convívio com o outro e, acima de tudo, da transformação de mentalidades e da geração de alternativas sociais.

domingo, agosto 08, 2004

Ele publicou muito pouco de seu trabalho, em vida. Dizem que por ser muito voltado para os outros, sempre, acabou por descuidar da própria obra. Não sei se há, realmente, tanto altruísmo em sua atuação. O que sei é que tudo o que ele escreveu, pelo menos o que já li - que, confesso, foi pouco - é interessantíssimo.
No entanto, digo que na verdade o que mais me interessa em Hélio Pellegrino é menos sua contribuição literária. Sem receios ou vergonha, digo que tenho um verdadeiro fascínio por sua vida, suas ações, seus valores e, acima de tudo, pela sua amizade com os escritores mineiros de sua época. (Aliás, posso dizer o mesmo também em relação à admiração que tenho por seu amigo, Fernando Sabino). Este apreço à sua vida pessoal não me parece um demérito, muito pelo contrário. Há intelectuais que admiramos por suas obras, artistas que nos impressionam com sua linguagem, sua arte, e há aquelas pessoas que admiramos apenas pelo que são, em essência: pessoas admiráveis, humanas, em tudo o que fazem em vida.
Hélio escrevia de forma surpreendente, instigadora, inusitada, polêmica. Talvez, então, pareça estranho valorizar mais sua existência pessoal, tão íntima e certamente sem pretensão de tornar-se objeto de admiração pública, que suas obras. Mas reafirmo que Hélio é como uma daquelas pessoas nas quais se descobre na simplicidade de sua vivência diária lições que artigo, romance ou tese nenhuma é capaz de transmitir. E é em suas cartas, seus ensaios, e em tantas reportagens, depoimentos, biografias e coletâneas que desvendamos um pouco dessa sua vivência.
Que ele seja, então, uma referência, não apenas de psicanalista, poeta, ensaísta, militante de esquerda ou polemista que foi, mas de ser humano, daquela qualidade rara que consegue transmitir, não apenas com suas palavras, mas também, e principalmente, com sua vida e suas ações, sua contagiante paixão pelo mundo e pelos seres humanos.

Lucidez embriagada. Um belo presente da Editora Planeta.


P.S. Estive vendo o blog da neta do Hélio Pellegrino, Antônia Pellegrino, que organizou o livro. Cheguei lá depois de ler uma reportagem sobre ele. Não li muita coisa ainda, mas parece ser bem legal. Ela, inclusive, faz uns comentários hilários a respeito do orkut. Identifiquei-me totalmente quando ela fala da resistência a entrar, do "anti-corpus-anti-orkut". Se bem que acho que, assim como ela, também irei sucumbir. :p
Bom, estou bastante envergonhado... Ainda não tinha colocado nenhum link para outro blog aqui (até mesmo porque a preguiça me fez não mexer ainda no template pra botar os links daqueles blogs que acho que valem a pena ler sempre), mas enfim... Chama-se www.invejadegato.blogger.com.br. Dêem uma olhada; eu depois também lerei com mais calma.


Para ouvir: Sigur Rós - ( )

sábado, agosto 07, 2004

Rapidinha (1 real):

Esquizofrenia urbana

De um aviso em um bar de Juazeiro, que só lembrei agora:

'Não é permitido: som de carro, jogo, dançar e permanecer sem camisa!"

...

Rapidinha (2 real):

Frase lida na Internet, dia desses, que ainda não esqueci:

"O chão é o limite"

Eu, pelo menos, achei genial. :p

...

Rapidinha (3 real):

Diálogo consigo mesmo:

- Pronto. Agora é só colocar a gravata e... abotoar! Pronto.
- Sim ,mas... e por onde é que eu respiro?

Em muitas tardes (no trabalho...)

O que dizer a alguém que vai embora e inicia nova fase em sua vida, cheia de incertezas e apego, talvez, ao que provavelmente fica, aos rostos levemente familiares que não mais serão vistos, senão muito esporadicamente? O que perguntar a quem está ao lado, tão enigmático em suas expressões indecifráveis, em sua tão aparente tranqüilidade, normalidade? O que aprender com as experiências vividas tão somente pelos outros? Como penetrar aquele sutil pensamento que por segundos se desnuda em um olhar? Onde encontrar a certeza daquela lágrima tão duvidosa, que nunca sabemos se esteve mesmo prestes a cair, se refletiu realmente uma comoção ou trata-se apenas de uma impressão errônea? Qual o verdadeiro valor de cada pequeno elemento cotidiano na nossa história? O que nos comove?
Há muitas perguntas não respondidas... Há a eterna dúvida que paira, perpetuando a ânsia do entendimento: até que ponto cada um é tocado pela vida, e em que intensidade?
Resta a despedida, a falta de intimidade, a mera curiosidade... O que lhe acontecerá, agora? Que futuro haverá de traçar para si, agora que para nós será só uma pessoa que aqui esteve, com a qual não chegamos a conversar muito, talvez, mas esteve, e agora estará em outros lugares, com outras pessoas, com seu sorriso ou sua lágrima a tiracolo... Acima de tudo, a incerteza da lágrima, que ao contrário do sorriso, raramente mostrar-se-á completa, indubitável...
Todos por aí passamos. Alguns ficam, outros partem logo para desarranjar com sua humanidade o vazio dos espaços onde ainda se farão presentes. Torcida, sinceros votos de sucesso, despedida... Nem era para tanto, afinal... Mas é bom; é o encontro, ao meio-dia...

P.S. Em minha apatia, em meu sincero egoísmo, houve, talvez, a impossibilidade do convívio. Mas há, paradoxalmente, o carinho, a gratidão, a saudade...

quinta-feira, agosto 05, 2004

Pausa para um comentário pra lá de estúpido, mas irresistível:

Na boa... Estudar História às vezes é um negócio bem surreal. Colombo, mesmo, era um doido. Queria chegar num canto no Leste e resolveu viajar em sentido oposto, pro Oeste, numa época em que isso era a maior loucura. Algo como querer ir pra Boa Viagem pegando o Rio Doce/CDU. Resultado dessa peripécia: a Pinta pipocou, avisando que todas as caravelas iam se estabacar na América. E o mais tragicômico disso tudo é que Colombo ainda passou um tempão lá, indo e vindo, jurando que tinha chegado nas Índias. Só depois que morreu é que, dizem, foi desfeito o engano (imagina as piadinhas que rolaram, na época...) por um cara que, por sinal, entrou de gaiato na história e ainda ficou com o maior mérito: botou o nome no que, na época, deve ter sido o maior elefante branco de todos os tempos...

...

Bom, agora vocês sabem porque tenho escrito menos aqui, lido menos os blogs alheios e aparecido menos no msn. Estou tentando estudar! (Se bem que as conclusões que tenho tirado do estudo não têm sido, como podem ver, nem um pouco proveitosas...) E haja besteira pra compensar tanta impaciência... :P

segunda-feira, agosto 02, 2004

Depois do meio-dia

Sujeira. Não aquela que se limpa fácil, mas a orgânica, mesmo, que cheira mal, apodrece...
Discussão na porta ao lado. Não um conflito melancólico, trágico, dolorido, mas aquela briga repleta de vulgaridade, saliva, brados alucinados, futilidades jogadas na cara com palavras feias e sentimentos “baixos”(?).
Palavras religiosas na parada de ônibus. Não uma simples pregação de fé, vontade boa de compartilhar a alegria de espírito, mas ameaça de inferno, sentenças carregadas de julgamento, veemência da alienação, voz alta que machuca os ouvidos com o exagero do exibicionismo xiita.
Almoço improvisado, rua da guia, sol quente...
Antes de tudo - da sujeira, da briga, do fundamentalismo, do lanche barato – a poesia de Drummond. Depois de tudo, soam ainda mais forte, na mente, os versos, as palavras...

“(...)
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.”

Trecho de “Os ombros suportam o mundo”, Carlos Drummond de Andrade


domingo, agosto 01, 2004

Respiro de novo. Outro respiro.